Dia B, por Bruno Antunes

>> domingo, 5 de julho de 2009

Nacionalidades

Sempre fui habituado a gostar de Portugal, a empunhar uma bandeira, a cantar o hino nacional, a gostar de ver Portugal ganhar no desporto, até a ver Portugal a marcar pontos na Eurovisão (raro). Sempre fui habituado, quando via o nome de Portugal lá fora, em jornais e televisões estrangeiros, a sentir algum orgulho. Afinal, é a nossa pátria que está em causa. Hoje em dia, quando considero sobre o que me foi ensinado, questiono se o patriotismo será algo positivo ou não. Excluamos o nacionalismo por ora, não é esse tema que quero aqui tratar.

Afinal que sentido fará achar que por nascermos num determinado ponto do globo sem sequer sermos tidos ou achados para isso, devemos amar esse local? Indo mais longe, não deveríamos apregoar aquela famosa canção de John Lennon “Imagine” em que se postula um Mundo sem fronteiras?

Indagando e pensando bastante sobre isto, chego à conclusão que faz todo o sentido gostar mais da nossa pátria que das outras. Apesar de não sermos (os que cá nascem) de determinada pátria por qualquer mérito (na maior parte dos casos) é no local onde nascemos que somos educados, onde partilhamos uma cultura, valores.
Possivelmente num Mundo no futuro, já se possa acreditar e aplicar um modelo sem fronteiras, um Mundo sem fronteiras de facto. Hoje já se ensaia algo semelhante, veja-se a União Europeia. No entanto, sempre deverá haver (sem querer fazer futurologia) alguma identidade própria que une determinado conjunto de pessoas, pela tradição, pelos costumes, pelos valores.

Na realidade, hoje e desde sempre, o crescimento de um país, cidade, região teve que ter por base a comparação com outro país, cidade ou região. Antes, e creio que hoje em dia já não tanto, era modelo comum a muito países, regiões, regimes, clubes pautar a sua actuação pelo estabelecimento de um inimigo comum. Exemplos há muitos. Hitler criou como inimigo os judeus e tudo o que não fosse ariano, O Estado Novo, tudo o que não fosse conservador de Direita, O Comunismo, tudo o que não fosse comunista, O F.C.P., o Benfica.

Hoje em dia, como referi, creio que esse modelo está mais esbatido, no entanto é ainda essencial uma comparação entre (chamemos-lhe) aglomerados de pessoas de alguma forma unidas por um ideal, para que esse crescimento se dê.
Ora, acima referi que este patriotismo, apesar de não provir muitas vezes de qualquer mérito, é perfeitamente admissível, aliás, de louvar.

Tomei conhecimento, com espanto, da notícia de que Maria João Pires iria renunciar à nacionalidade portuguesa, permanecendo apenas como brasileira. Fiquei ainda mais estupefacto com os fundamentos invocados pela pianista. Pelos vistos, a artista renuncia à nacionalidade portuguesa porque o Governo não financiou os seus projectos convenientemente. Imaginemos que todas as pessoas que se sentem de uma outra forma prejudicadas por este ou outro Governo tomassem a mesma decisão. Haveria portugueses? Haveria algum cidadão com nacionalidade no Mundo? Prestando mais atenção ao caso concreto. Percebe-se, que quando “a manta não estica”, o mesmo é dizer, quando não há dinheiro para tudo, que um Governo aposte com maior intensidade em sectores fundamentais, como a Saúde, Educação, Justiça, do que noutros não tão essenciais, como a Cultura. Não se deve abdicar de investir nesta área, mas compreende-se a moderação no investimento. Para além disto, a pianista parece incorrer num enorme erro, confundir o Estado com os órgãos que o compõem. Os Governos passam, mas o Estado mantém-se. Compreende-se que alguém tome a decisão de mudar de país de residência e trabalho para ter melhores condições de vida, para poder exercer melhor a sua actividade. Tenho mais dificuldade em compreender, em aceitar que alguém deixe de ter uma nacionalidade, a não ser, claro está, por razões de sobrevivência.

A decisão é da pianista, obviamente, e é-lhe lícito fazê-lo. No entanto, não deixa de merecer reparos.

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