Voto Obrigatório, por Sara Sousa Santos*

>> sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Quando se fala em voto, ou sufrágio, é inevitável vir à memória a palavra Democracia, cuja essência reside na ideia do poder nas mãos do povo, sendo este quem decide. O voto, ou sufrágio, pode ser facultativo, sendo o seu exercicío deixado à vontade dos eleitores, ou obrigatório, quando o eleitorado é obrigado a votar sob pena de ser objecto de sanções, que podem revestir diversas formas(censura pública, multa, incapacidade temporária de exercicio de funções públicas, pagamento de determinada contribuições ou multas).

De facto, o conceito do voto obrigatório apareceu na Grécia Antiga, sendo o seu precursor Solón, considerado um dos Sete Sábios da Grécia Antiga e o pai da primeira grande e profunda reforma politica na Grécia, o qual criou uma lei que obrigava os cidadãos atenienses a não se absterem nas votações da assembleia, caso contrário perderiam os seus direitos (foi esta a primeira ideia de sufrágio obrigatório).
Na actualidade, o sufrágio obrigatório é lei em países como o Brasil, a Bélgica, o Luxemburgo e a Grécia.

Na generalidade das discussões acerca da conveniência ou não do sufrágio obrigatório, existem vários argumentos consistentes. Quem é a favor do sufrágio obrigatório tem por hábito defender que o voto é antes de mais um dever; que por meio do voto obrigatório a grande maioria dos cidadão adere ao acto eleitoral, participando mais activamente; que a consistência do voto obrigatório permite uma maior e melhor educação politíca dos cidadãos, beneficiando em larga medida o processo eleitoral. Os defensores do voto facultativo, por seu lado, argumentam que o voto é um direito, o qual se adequa mais à vontade de as pessoas de se dirigirem ou não às urnas de voto; é o mais adoptado pelos paises dito desenvolvidos e de elevada tradição democrática; esta forma de voto melhora a qualidade do pleito eleitoral pela participação de eleitores conscientes e motivados e que é ilusão acreditar que o voto obrigatório possa gerar cidadãos politicamente evoluídos.

Em Portugal, o direito ao voto encontra-se consagrado no artigo 49º da Constituição da República Portuguesa, incluído no capítulo dos “Direitos, liberdades e garantias de participação politíca”, ou seja, é um direito fundamental, que imputa ao cidadão a capacidade de ser parte activa na sociedade politíca. Estamos perante um direito fundamental, que como explica o Prof. Jorge Miranda são “os direitos ou posições jurídicas subjectivas das pessoas enquanto tais, individual ou institucionalmente consideradas, assentes na Constituição da República Portuguesa”.

Contudo, a par de outros direitos constitucionalmente consagrados, existem deveres ligados a direitos fundamentais, são os chamados deveres conexos com direitos fundamentais. E neste campo podemos referir que o dever civico do voto está conexionado com o direito de voto (artigo 49º/2 CRP). É um dever de carácter cívico-politíco, um dever do cidadão para com o Estado, relacionado com a própria existência e funcionamento da colectividade politíca organizada.

Pelo exposto, e em jeito de conclusão, esta temática surge quase sempre após os diversos actos eleitorais realizados. E isso deve-se às elevadas taxas de abstenção que se registam, um pouco por todo o lado, mas mais particularmente em Portugal. O sistema democrático enfrenta constantemente novos desafios e não se pode evitar a mudança!

Votar é, assim, mais do que um direito, é um dever, o dever da responsabilidade que cada cidadão tem para com o país, quando escolhe os seus representantes, quando decide quem governa, podendo mudar o rumo do país (ou da União Europeia, no caso disso) e é a sua oportunidade para se fazer ouvir.
Sou a favor do voto obrigatório, sem dúvida!

Tenho trocado opinião com amigos, colegas, companheiros. Muitos refutam os meus argumentos. Falam em antidemocrático, outros até referem a sua inconstitucionalidade. A meu ver, o sufrágio obrigatório nada tem de antidemocrático, aliás, acredito que enriquece a democracia, colocando à prova a qualidade dos nossos políticos... aliás, os cidadãos apenas são “obrigados” a votar... mas podem sempre votar em branco!

Também nada tem de inconstitucional. Como anteriormente referi, o direito ao voto é um direito fundamental, como tal, a natureza dos direitos fundamentais, como principios ordenadores, não significa que através deles se processo uma supraordenação, os limites dos direitos fundamentais não são apenas formados por outros direitos fundamentais. No sentido de fugir ao completo falseamento do acto eleitoral onde se verifique uma elevada abstenção, manifetsndo-se apenas a “opinião” de uma minoria, há que proteger acima de tudo o Estado de Direito!!!

* A Sara Santos, é a actual presidente da Secção E, do Concelho de Lisboa, exercendo o cargo desde 2008. Para além disso, também desde 2008, coordena a área da formação da actual Distrital de Lisboa.

3 comentários:

Pedro Jesus 12 de fevereiro de 2010 às 02:58  

Muitos parabéns à Sara e ao Tiago por mais um artigo esclarecedor para os já muitos seguidores deste blog!

Tiago Mendonça 12 de fevereiro de 2010 às 10:54  

Obrigado pelas palavras simpáticas Pedro!

Um abraço.

Ana Santos 12 de fevereiro de 2010 às 23:07  

"...os cidadãos apenas são “obrigados” a votar... mas podem sempre votar em branco!"

Podem ser argumentos muito válidos por parte dos defensores do voto obrigatório e respeito-os!

Mas continuo a achar que esta não é a forma mais eficiente e correcta para combater tão elevados níveis de abstenção!

De que adianta obrigar os cidadãos a ir às urnas? Será que os cidadãos iriam votar em responsabilidade ou iriam apenas para marcar presença?!?!

Será que é assim que construímos uma democracia na responsabilidade?!?!

Pois a minha resposta é NÃO! E mantenho a solução que já apresentei num outro comentário neste blogue: "...é necessário começar a intervir desde cedo para que se obtenham jovens informados sobre a importância do voto, para que a sociedade possa ser politicamente activa!"