A escaldar, por Nélson Faria

>> segunda-feira, 20 de abril de 2009

4ºTema - Drogas Leves



Não existe ciência na distinção entre drogas “leves” e drogas “pesadas”: há usos “pesados” de drogas “leves” e usos “leves” de drogas “pesadas”. Temos que arejar a cabeça quando falamos de drogas para não dar a azo a ideias como “ há drogas piores e drogas menos más”.

É complicado generalizar porque são muitas e com efeitos diferenciados, mas arrisco dizer que as drogas, entorpecendo os nossos sentidos, servem como escape: é uma forma de fugirmos da realidade. Há quem goste de alimentar a ilusão classificando esta experiência como uma viagem ou liberdade sem limites. Algo que nos limita os sentidos, e que brinca com a nossa mente ao ponto de perdermos consciência, dificilmente nos torna livres.

As drogas têm uma longa história que acompanha a Humanidade, e tornaram-se frequentemente aceites como lubrificante social. É curioso que apesar dos seus efeitos negativos nós teimemos e persistamos neste hábito. Não tenho rancor ou preconceito, até porque sou consumidor habitual de duas delas – álcool e tabaco – e ocasional de outras menos “convencionais”, mas não deixo de me questionar...



Não encontro lógica nem argumentação sólida para justificar esta prática: conheço os riscos, e ainda assim permito este ataque à minha identidade. É um enorme contra-senso, mas pensamos muitas vezes que temos a necessidade de fugir e imaginarmo-nos outro, mais poderoso, mais dono de si, descomplexado, livre. O que se torna ainda mais caricato quando pensamos que o resultado é exactamente o oposto: temos menos controlo, tornamo-nos mais vulneráveis, estamos mais dependentes.

Plutarco afirmou que “quem tem muitos vícios tem muitos amos”. Não nos restem dúvidas que as drogas em ponto algum nos tornam melhores, mais fortes, mais autónomos ou mais donos de nós mesmos. A droga é uma enorme, prejudicial e desautorizada ilusão.

Tenho pouca fé na política da proibição. Considero-a mesmo contra-producente: a proibição conduz-nos a zonas de conforto, de não discussão, de conformismo, o que espicaça a curiosidade. Entendo que falta um grande debate sobre drogas, sem complexos nem pré-conceitos, sem os “liberalizadores” dizerem que cannabis não faz mal nenhum, nem os castradores de ocasião compararem cada “consumidor” a um criminoso.



A dependência de drogas destrói vidas, e perante esse facto inegável e indisputado temos, enquanto sociedade, de reagir. Mas mais do que leis que facilitem ou dificultem, temos de ganhar consciência social. Os países não se constroem por decreto, os hábitos não se perdem por força de lei, não há ASAE que nos valha para inspeccionar o comportamento de cada um ou cadeias suficientes para prender todos, nem podemos dar-nos ao luxo de assistirmos impávidos à destruição do outro.

Resta-nos, como sempre, o lugar de batalha comum: as mentes de todos. Podem começar pela minha.

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